Pular para o conteúdo principal
A Cultura Circense e os Cafonas Poliglotas
![http://4.bp.blogspot.com/-EGlyLI_Ikf4/T38eJdG4-rI/AAAAAAAA8ZM/3yQVoZLUzb8/s1600/Vito+Campanella++%252821%2529.jpg](//4.bp.blogspot.com/-EGlyLI_Ikf4/T38eJdG4-rI/AAAAAAAA8ZM/3yQVoZLUzb8/s400/Vito+Campanella++%252821%2529.jpg)
Gustavo Miquelin Fernandes
Fiz a leitura do livro "A Civilização do Espetáculo", do grande
intelectual liberal (tinha que ser!) Mario Vargas Llosa. O autor
constata a total debacle da civilização no quesito produção de cultura
(ou seria reconhecimento?), a um tempo que o mundo prega sua agressiva
democratização e o acesso universal a esse bem. Cultura é bem público e a
todos deve ser franqueado - dizem os especialistas.
Esta
democratização forçada, como que uma "distribuição em caminhão" à
população, causa, paradoxalmente, sua singular diluição e perdimento.
Elitista? E quem disse que conceito puro de elitismo é ruim? Não é, por
óbvio! Isso é ideia velha e de gente que não entendeu o que é e para que serve uma elite.
As instituições que fazem cultura e
conservam-na (religião, Universidade, a intelectualidade, etc.), neste mesmo momento, sofrem com ela a mesma queda
espetacular o que, para mim, não fica muito claro se em razão dela,
concomitante ou anteriormente a ela, cultura.
Assim, a
supervalorização da imagem, em total abandono à palavra, revelando hegemonia
total do reino sinestésico. Signos gráficos, orais e musicais vão se
prostrando vergonhosos aos sinais exteriores que impregnam os ambientes culturais.
Chega pra ficar a
cultura de massa, enlatada, pop, do tipo mesmo Paulo Coelho, que já se
arvorou - absurdamente e sem nenhum senso de proporção - em dizer ser o maior intelectual do país, lavrando o
"Atestado de Fundo do Poço" que o país chegou e se demora a sair.
A cultura, antes
tida como experiência espiritual de alcance momentâneo ao universal, ao
espírito da mathesis (conhecimento absoluto), elevando e aproximando o
ser da Criação, agora vira entretenimento, diversão mundana e às vezes
bem da vagabunda. A leitura rápida, a sexualização explícita ao revés do erotismo, o uso sistemático de chavões e clichês e,
como dito, o predomínio do reino das imagens, onde a mídia exerce
fundamental importância na missão de nos trazer o espetáculo.
Sem
críticas
à mídia, bom que se diga; crítica apenas aos indivíduos demandantes. O
espetáculo existe positivamente. Não se trata, pois, de se criticar essa
existência, mas sim nossa demanda individual por subcultura. Lembrando
ainda algo que nem preciso dizer: a liberdade de cada um demandar o que
bem quiser.
Esta liberdade, entretanto, não o exime, por óbvio, do direito de ser críticado.
Vejo o
surgimento de um novo dadaísmo, um criticismo barato das antigas formas
e signos tradicionais, promovendo a criatividade dita social, do
engajamento cego, da militância manobrada, das causas com apelo
populistas, do marketing e do, e isso é por demais grave: esnobismo
daqueles que têm contato com um arremedo de cultura: uma literatura mais
sofisticada, viagens internacionais, visitas a museus, acesso à
proliferação editorial meramente mercadológica. Tais pessoas se acham cultas; em
verdade, são verdadeiros "cafonas poliglotas" e não passam disto.
A
experiência cultural, quase estado místico, vira mero divertimento ou
passar de horas tediosas, algo como a leitura dum almanaque se equivaler
a um Dostoiévski ou Machado de Assis.
Hoje, a fuga não é da
absurdidade, de conflitos interiores ou transcendentais, de questões últimas de existências, simplesmente é a
fuga do tédio de viver e dos conflitos medíocres do homem comum.
Novamente, a presente crítica não é à mediocridade (eu me acho medíocre!), e
sim à demanda que fazemos para aliviá-la momentaneamente.
A
cultura antropológica tem que ser diferenciada da alta cultura. Aquela
não passa de manifestações muito regionais como funks, artes de ruas,
etc. Cultura, em essência, é a aproximação estética do universal e isso
não se dá por via de manifestações muito locais e mais ou menos
improvisadas. Cultura é um fenômeno que abarca obras de arte, o sacro, a Religião, a
Filosofia, o know how acadêmico, as personalidades emblemáticas, a
Arquitetura, etc. Todos esses conceitos, percebam, bastante universalizados e com raízes muitos
fortes na Civilização.
Na ponta desse problema, o multiculturalismo a
igualar artificialmente tudo numa vala comum. E não é!
Há culturas
primitivas, rústicas e desprezíveis e coisas de boa qualidade. Há
religiões ruins, músicas ruins, obras ruins, ao passo que há esses mesmos elementos
dotados de inegável harmonia.
Coisa mais desagradável é
dialogar com gente que se acha "cult", na verdade, um bando de cafona e
esnobes, insuflados pela publicidade, pela mídia fast food e por agentes
de intoxicação: professores revolucionários e progressistas, formadores
de opinião, etc.
A mudança da percepção entre o eixo do culto e
da "cultura pop" faz os realmente interessados se afastarem do meio de
debate e discussões, deixando caminho aberto para esses "pós-modernos", com concepções
antropológicas muito errôneas a contaminar o ambiente cultural.
Nada pra assustar quando um colunista de jornal de nossa região sai por
aí dizendo que se deve introduzir com mais vigor o estudo do marxismo
nos bancos escolares. Percebam o estado de coisas!
A cultura
com orientação da burocracia, fornecidas a todos gratuitamente, onde
todos se regozijam e acham que consomem coisa de grande valor, jamais
pode ser confiável, salvo se seu agente produtor seja reconhecidamente
independente.
A cultura medíocre nasce através de homens medíocres. Como diria Gasset, os "senhoritos satisfechos".
A Era dos computadores fez nascer vários gênios anônimos, sem corpo,
altamente intelectualizados, beletristas e dispostos a mudar o mundo, com receitas prontas para tudo,
mas que quando encarnados e visíveis pessoalmente são incapazes de fazer
a mais reles observação ou contribuição séria e talvez um pouco satisfeitos com a vida que
levam, contrariando o espírito revolucionário que pregam.
É que o alvo
maior sempre é a mudança do mundo, dos outros, da sociedade, da Humanidade inteira. Por isso, eu digo com o
filósofo Pondé: "sou contra um mundo melhor".
A cultura é
alicerce e substrato e dá firme sustentação aos regimes políticos e
sociais e
também à base educacional de um país. Porém, como ela está por baixo,
até meio oculta, é difícil fazer essa constatação. Pode estar aí um dos
nossos
grandes problemas.
Comentários
Postar um comentário