Gustavo Miquelin Fernandes
Os
contratos são resolúveis pelas inexecuções que, por sua vez, se
subdividem entre mora e inadimplemento. Inadimplemento é a inexecução
impossível de ser cumprida doravante; mora, apenas atraso, com possibilidade de
execução ulterior.
Segundo
o artigo 475 do Código Civil:
Art. 475. A parte
lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir
exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por
perdas e danos.
Assim,
a parte que sofrer com a inexecução pode resolver o contrato ou requerer, em caso
de mora, que mesmo assim o outro cumpra sua parte, exigindo, nos dois casos, a
indenização correspondente.
Porém,
a teoria da substancial performance, com origem na Inglaterra, prega que, se o contrato foi
cumprido substantivamente ou em suas partes principais, próximo do resultado
anteriormente firmado, não se pode simplesmente resolvê-lo, franqueando-se à
parte prejudicada apenas o pleito indenizatório e que requeira ainda o
cumprimento da parcela não cumprida da obrigação.
Não
se resolve o contrato “quase-cumprido”.
Por
essa tese, não se decreta automaticamente a resolução do contato, com a quebra
das obrigações das partes, se atendo apenas à condições muito formais ou adjetivas
do contrato, mas se observa de maneira global se as condições foram cumpridas razoavelmente,
em proximidade do anteriormente contratado.
Em
suma, a teoria observa se os elementos principais da contratação foram
devidamente saldados pelas partes, de maneira muito global. Visa teoricamente
afastar supostas formalidades existentes nas relações obrigacionais, em prol duma
efetividade social e razoabilidade no cumprimento das avenças, atendendo o
princípio da boa-fé objetiva, dentro da já citada razoabilidade. Poderia ainda
se argumentar que a resolução da avença poderia ainda trazer mais danos às
partes.
Como
exemplo, analisado pela Terceira Turma do STJ, tem-se o caso de uma
transportadora que ajuizou reintegração de posse contra outra empresa pelo débito
de seis parcelas, do total de 36, em contrato que tinha como o objeto 135
carretas. Em Recurso Especial, a empresa pediu a extinção do contrato,
sustentando que o fato de faltar apenas um quinto do valor a ser quitado não
servia de justificativa para o inadimplemento da outra contratante. O relator
do recurso aplicou a teoria do adimplemento substancial: “Tendo ocorrido um
adimplemento parcial da dívida muito próximo do resultado final, limita-se esse
direito do credor, pois a resolução direta do contrato mostrar-se-ia um
exagero, uma iniquidade”.
Referida teoria não conta com previsão expressa na lei civil, mas a jurisprudência se manifestava bastante acerca da tese, conforme se vê:
Referida teoria não conta com previsão expressa na lei civil, mas a jurisprudência se manifestava bastante acerca da tese, conforme se vê:
Data
de publicação: 04/05/2011
Ementa: RESOLUÇÃO DE CONTRATO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA
DE IMÓVEL ENTRE PARTICULARES. ADIMPLEMENTO
SUBSTANCIAL DO CONTRATO PELOS REQUERENTES. DIREITO À
RESTITUIÇÃO PARCIAL DO MONTANTE PAGO. AUSÊNCIA DE PROVA DE CULPA DO REQUERIDO
PELA RESCISÃO DO PACTO. Recurso parcialmente provido. (Recurso Cível Nº
71002912491, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Ricardo
Torres Hermann, Julgado em 28/04/2011)
Data
de publicação: 09/01/2013
Ementa: ARRENDAMENTO
MERCANTIL - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL
DO CONTRATO - OCORRÊNCIA
-PAGAMENTO DE 44 DAS 48 PRESTAÇÕES CONVENCIONADAS - REVOGAÇÃO DA LIMINAR
POSSESSÓRIA - CABIMENTO - PURGAÇÃO DA MORA E APRESENTAÇÃO DE DEFESA -
POSSIBILIDADE. O adimplemento substancial do contrato inviabiliza o deferimento de liminar possessôria a favor
da arrendadora,pois tal medida se mostra excessivamente lesiva ao devedor em
comparação ao total já pago. Porém, não se pode falar em extinção da ação
possessôria sem apreciação do mérito,de modo que, orientado pelos princípios da
equidade, da proporcionalidade e da boa-fé objetiva, necessário oportunizar ao
devedor tanto o direito de purgação da mora,como para defesa.RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO.
Data
de publicação: 26/05/2011
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. BUSCA
E APREENSÃO. TEORIA DO ADIMPLEMENTO
SUBSTANCIAL DO CONTRATO. IMPROCEDÊNCIA DA BUSCA E
APREENSÃO DO VEÍCULO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. No caso, deve prevalecer a
teoria do adimplemento substancial ou inadimplência mínima,
uma vez que a parte agravada fez por adimplir com quase a totalidade do
compromisso estabelecido com o apelante, deixando de pagar as ultimas parcelas
do contrato por estar acometida
de doença em estado comatoso. Recurso ao qual se nega seguimento, na forma do
art. 557 do CPC .
Sem
entrar em análise do mérito dessa figura, constitui, sem dúvidas, uma das
formas de relativização da força cogente do contrato, o que demanda muita
racionalidade e cuidado em seu manejo para que não traga danos à unidade do
sistema obrigacional, nem apelos ou convites ao enriquecimento ilícito das
partes contratantes.
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